Volta Grande do Xingu investiga o passado

Curadoria Litico – Laboratorio. Foto de Divulgacao

25 sítios arqueológicos foram identificados na área de exploração da mineradora Belo Sun, no Pará

Por Claudia Silva Jacobs | ODS 14 • Publicada em 17 de setembro de 2017 - 09:10 • Atualizada em 19 de setembro de 2017 - 23:38

Curadoria Litico – Laboratorio. Foto de Divulgacao
Curadoria Litico - Laboratorio. Foto de Divulgacao
Pesquisadora da empresa Inside Consultoria cataloga os fragmentos encontrados nas escavações. Foto de Divulgação

O passado da Volta Grande do Xingu está sendo desvendado e recriado com fragmentos de 25 sítios arqueológicos do período pré-colonial. Os achados das escavações estão na área da mineradora Belo Sun, em Senador José Porfírio, no Pará. Seis destes sítios serão impactados e, possivelmente, vão desaparecer em meio a exploração de ouro – o empreendimento teve sua Licença de Operação suspensa, recentemente, pelo Ministério Público Federal do Pará. Cerca de 200 mil fragmentos já foram coletados,  catalogados e passam por um processo de recuperação e reconstituição. Ao final dos estudos, este tesouro arqueológico será enviado para a Fundação Casa de Cultura Marabá.

É a primeira vez que uma pesquisa arqueológica ocorre na região da Volta Grande. Séculos de história podem ajudar a entender a movimentação dos povos tradicionais e o processo de ocupação da Amazônia desde o século XVII. Depois de sete anos de escavações, a quantidade de fragmentos impressiona – é como caminhar pela história, bem guardada entre a natureza densa da Floresta Amazônica. Boa parte do material descoberto, no entanto, continua onde está, o que pode revelar mais detalhes sobre a vida e os povos da região, em projetos futuros.

Vínculos amazônicos 

Arqueolgos na Volta Grande do Xingu. Foto de Divulgacao
Arqueólogos recolhem fragmentos encontrados nas escavações. Foto de Divulgação

Os pesquisadores conseguiram identificar, através dos objetos coletados, que a região conhecida como Acampamento Verena, formava, possivelmente, um aldeia densa e extensa, com muitos objetos considerados de valor. Além disso, detectou-se a existência de uma rede de relacionamento entre as tribos do médio Xingu e Baixo Amazonas, colocando em xeque a ideia de que as tribos indígenas viviam relativamente isoladas e apenas em pequenas comunidades.

A quantidade de fragmentos impressiona em toda a região. Você caminha sobre cacos, pequenos utensílios, fica impossível recuperar e catalogar todo o material

Um dos argumentos que fortalece a teoria foi a descoberta, pela primeira vez na região do Médio Xingu, de um muiraquitã (objeto de significado mítico, muitas vezes obtido por pessoas de alto status dentro das sociedades pré-históricas, que funcionava como um talismã). Até então, este tipo de objeto só havia sido encontrado na região do Oeste paraense, o que demonstra, para os pesquisadores, uma movimentação entre os povos. A descoberta deste objeto, segundo os especialistas, indica a existência de algum nível de hierarquização social e mesmo política, além de redes de trocas entre as regiões do médio Xingu e o Baixo Amazonas.

“A quantidade de fragmentos impressiona em toda a região. Você caminha sobre cacos, pequenos utensílios, fica impossível recuperar e catalogar todo o material”, explicou Antônio Kallil, geólogo da Belo Sun Mineração, a frente do trabalho nos sítios arqueológicos na área da mineradora.

Vasilha reconstituída. Foto de Divulgacao
Vasilha reconstituída. Foto de Divulgação

Dos 25 sítios identificados, apenas os seis deles estão na área diretamente impactada pela mineradora. Os outros sítios podem fazer parte da continuação dos estudos, caso a região abrigue outras áreas de exploração futuramente, o que não está descartado.  Neste momento, a empresa Inside Consultoria (contratada pela mineradora Belo Sun) está realizando todo o processo de catalogação e de recuperação de algumas peças, tentando remontar de forma mais precisa as sociedades que habitavam a região. Do conjunto de peças descobertas, destacam-se cacos cerâmicos (em maior quantidade), fragmentos líticos de pedra polida, pedra lascada, lâminas de machado e afiadores ou polidores.

Dúvidas e incertezas entre os moradores

Achados arqueologico. Foto de Divulgacao
Achados arqueológicos. Foto de Divulgação

Toda a movimentação de pesquisadores na região chamou a atenção dos moradores de vilarejos próximos as terras de Belo Sun, suscitando indagações sobre as descobertas, o real valor das peças ou mesmo o que foi encontrado. Fala-se em tesouros, peças extremamente valiosas, que estariam sendo retiradas pela companhia. A Belo Sun, no entanto, explica que todas as peças catalogadas estão sendo analisadas e os objetos recuperados.

Para facilitar o entendimento sobre os estudos arqueológicos, foi desenvolvido um projeto envolvendo estudantes, professores e a parte da população das áreas mais próximas ao empreendimento, visando apresentar o material recuperado e o que representam no resgate histórico/cultural para os povos da Volta Grande.  Alunos foram levados aos sítios arqueológicos e puderam acompanhar o trabalho dos pesquisadores e conferir as peças resgatadas. O material e as conclusões iniciais dos estudos estão agrupados em um livro, “Estudos Arqueológicos e Educação Patrimonial no Projeto Volta Grande“, que foi distribuído para instituições culturais e educativas.

“A obra reúne informações que vão desde a ocupação histórica da área da Volta Grande, passa pelos trabalhos de prospecções, resgate, salvamento dos sítios, descrições das peças e da composição química de onde esses sítios foram encontrados”, explica Antônio Kallil.

Agora, é torcer para que o trabalho não pare por aí, já que existe um patrimônio histórico/cultural inestimável nas terras amazônicas, o que pode ajudar a entender melhor a historia dos povos tradicionais e da ocupação da região mais rica do planeta.

Claudia Silva Jacobs

Carioca, formada em Jornalismo pela PUC- RJ. Trabalhou no Jornal dos Sports, na Última Hora e n'O Globo. Mudou-se para a Europa onde estudou Relacões Políticas e Internacionais no Ceris (Bruxelas) e Gerenciamento de Novas Mídias no Birkbeck College (Londres). Foi produtora do Serviço Brasileiro da BBC, em Londres, onde participou de diversas coberturas e ganhou o prêmio Ayrton Senna de reportagem de rádio com a série Trabalho Infantil no Brasil. Foi diretora de comunicação da Riotur por seis anos e agora é freelancer e editora do site CarnavaleSamba.Rio. Está em fase de conclusão do portal cidadaoautista.rio. E-mail: claudiasilvajacobs@gmail.com

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