Mais digital, menos pobreza

Um selfie à indiana: país cresceu com o investimento no digital (Foto Sam Panthaky / AFP)

Avanço no setor é oportunidade de crescimento para nações em desenvolvimento

Por José Eduardo Mendonça | Economia VerdeODS 1ODS 14 • Publicada em 12 de outubro de 2016 - 08:01 • Atualizada em 2 de setembro de 2017 - 15:42

Um selfie à indiana: país cresceu com o investimento no digital (Foto Sam Panthaky / AFP)
Um selfie à indiana: país cresceu com o investimento no digital (Foto Sam Panthaky / AFP)
Selfie à indiana: país cresceu com o investimento no digital (Foto Sam Panthaky / AFP)

Cada vez vez mais a economia digital contribui com o PIB de países em desenvolvimento. Ela tem um papel importante ao encorajar a inclusão,  aliviar a pobreza, reduzir a assimetria de informação entre trabalhadores pobres ou rurais e induzir a entrada na força de trabalho de mulheres e jovens. Pelo menos é isso que sustenta um novo relatório do Banco Mundial.

Os jovens, primeiros a se envolver com novas tecnologias digitais, muitas vezes procuram empregos em setores de alta tecnologia críticos para o desenvolvimento de mão-de-obra internacionalmente competitiva em um mundo crescentemente interconectado.

No entanto, a nova era da globalização, de fluxos transfronteiras de bens e capital e ainda de dados e informação, parece favorecer as economias avançadas, cujas indústrias estão à frente no emprego de tecnologias digitais em seus produtos e operações. Isto torna difícil a atuação do mundo em desenvolvimento. Estes fluxos estão desproporcionalmente concentrados em um pequeno número de países, incluindo Estados Unidos, Reino Unido, Alemanha e Cingapura, com grandes fossos entre os líderes e seguidores. A China é a única economia emergente a chegar aos maiores dez, lembra estudo da McKinsey.

Por muito tempo, buscar a manufatura mundial de baixo custo pareceu ser o modo mais promissor de nações de baixa renda perseguirem o desenvolvimento. O comércio global de bens cresceu de 13.8% do PIB mundial em 1985 (U$ 2 trilhões) para 26.6% do PIB em 2007 (U$ 16 trilhões). Empurrado pela demanda e terceirização da economias avançadas, mercados emergentes absorveram fatias maiores do comércio de bens, e respondiam por mais da metade do fluxo global de comércio em 2014.

O mercado estagnou desde a recessão de 2008, mas o uso transfronteira de banda larga cresceu 45 vezes na última década, fazendo circular ideias, conteúdo e inovação pelo mundo. Isto fez crescer o PIB mundial em cerca de 10%, ou mais U$ 7.8 trilhões apenas em 2014. Os fluxos de dados responderam por U$ 2.8 trilhões deste ganho, com um impacto maior que o comércio mundial de bens. Isso é notável, uma vez que as redes mundiais de comércio têm séculos, e os fluxos de dados transfronteiras têm 15 anos, lembra o Banco Mundial.

A ausência de um mercado digital em muitos países em desenvolvimento é de alguma forma vantajosa. Isto pela mesma razão pela qual foi mais fácil introduzir novas tecnologias e serviços no começo da era digital em nações já desenvolvidas do que é hoje. Há muito espaço para inovação e avanço

Se, por conta disso, o caráter da economia passa por rápida transformação, a passagem para a globalização deveria deixar em má situação países em desenvolvimento com grandes massas de mão-de-obra barata, mas infraestrutura e sistemas educacionais inadequados. Pode, porém, não ser assim.

A ausência de um mercado digital em muitos países em desenvolvimento é de alguma forma vantajosa. Isto pela mesma razão pela qual foi mais fácil introduzir novas tecnologias e serviços no começo da era digital em nações já desenvolvidas do que é hoje. Há muito espaço para inovação e avanço e, no caso das nações em desenvolvimento hoje, a inspiração de ideias, modelos de mercado e de negócios e uma ideia geral do que funcionou ou não. Alguns  países, como Turquia, Romênia e Índia vivem momento semelhante ao dos Estados Unidos há 20 anos: existe muitas áreas onde cabe interesse que ainda nem foram consideradas como possibilidades de investimento.

Além disso, há empresas locais e internacionais buscando capitalizar o desenvolvimento deste mercados emergentes, o que traz benefícios tanto para a economia local quanto a internacional. E os custos marginais próximos de zero das comunicações e transações cria novas possibilidades de condução de negócios transfronteiras em escala maciça.

Companhias baseadas em países em desenvolvimento podem sobrepujar constrangimentos locais de mercado e se conectarem com consumidores, fornecedores, investidores e talento no mundo todo. Doze por cento do comércio internacional de bens já acontece online.

Mas a internet só pode contribuir com estas melhoras em eficiência e transparência se os países construírem uma infraestrutura digital para uma imensa população offline. O número de usuários de internet no mundo passa agora de 3.2 bilhões, mas, ao final de 2015, 57% da população mundial, ou 4 bilhões de pessoas, permaneciam offline, e a maior parte das que estão online usam apenas celulares. Em muitos países mais pobres, a conectividade é muito lenta, inconfiável ou cara para permitir uma vantagem competitiva a empreendedores e indivíduos.

Sem contar a questão da infraestrutura, o outro ponto para a chegada da revolução digital é o mercado. No entanto, e talvez os casos mais notáveis sejam China e Índia, há populações de centenas de milhões de pessoas dispostas a abraçar tanto o estilo de vida que virá com a revolução quanto os empregos que virão com ela.

O mundo desenvolvido ainda mantém a liderança na economia global, com 60% do mundo em desenvolvimento controlando apenas 40% da taxa atual de crescimento econômico. Este número representa Brasil, Rússia, Índia, China e Indonésia combinados, mas a divisão não é proporcional à população. O Brasil tem as maiores taxas de crescimento econômico do mundo nos últimos dez anos, relativas à sua renda em qualquer ano dado. Mas tanto aqui quanto na Indonésia, por exemplo, o dinheiro gasto em publicidade online vem mostrando aumento exponencial nos últimos anos, um sinal do avanço da adoção da economia digital.

Falando de maneira geral, países que estão apenas emergindo como poderes no cenário mundial estão experimentando crescimento significativo especificamente no mercado digital. Em termos de ranking mundial entre nações, de 1996 a 2012, a Índia subiu 16 pontos, o Marrocos, 24, e o Brasil, 15. Já países como Alemanha subiram um ponto, enquanto Estados Unidos e Grã-Bretanha caíram um ponto cada. Todas as economias digitais emergentes que cresceram mais durante este período têm uma coisa em comum: estão investindo muito no mercado digital e tecnológico e construindo infraestrutura física destinada especificamente a hospedar tecnologia moderna para um avanço continuado.

Com tudo isso, não apenas os países em desenvolvimento serão capazes de manter uma vantagem competitiva no mercado digital, como a emergência de uma economia digital global trabalhará em seu favor em termos de desenvolvimento contínuo.

Claro que estes cenários não se tornarão uma realidade com governos presos e modelos ineficientes e obsoletos de desenvolvimento, que possam regular e apoiar políticas favoráveis. Só assim países terão a capacidade de se reinventar. O mundo muda depressa e as soluções antigas não funcionam mais, lembra o Fórum Econômico Mundial.

José Eduardo Mendonça

Jornalista com passagens por publicações como Exame, Gazeta Mercantil, Folha de S. Paulo. Criador da revista Bizz e do suplemento Folha Informática. Foi pioneiro ao fazer, para o Jornal da Tarde, em 1976, uma série de reportagens sobre energia limpa. Nos últimos anos vem se dedicando aos temas ligados à sustentabilidade.

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