As disputas na COP21

Reunião dos negociadores na Conferência do Clima

Negociações emperram quando o tema é financiamento

Por Liana Melo | FlorestasODS 13ODS 14 • Publicada em 4 de dezembro de 2015 - 09:04 • Atualizada em 2 de setembro de 2017 - 15:57

Reunião dos negociadores na Conferência do Clima
Reunião dos negociadores na Conferência do Clima
Negociadores discutem texto do documento, que será apresentado na segunda a Laurent Fabius, presidente da COP-21

O poetinha escreveu em ‘Samba da Bênção’ que é melhor ser “alegre que ser triste/ A alegria é a melhor coisa que existe”. Como nem sempre é possível fazer essa escolha, o jornal britânico ‘The Guardian’ optou em publicar esta semana um balanço equilibrado com os  prós e os contras que rondam a COP21.

O periódico levantou quatro razões para acreditar numa conferência com final feliz e outras quatro bem menos alvissareiras. Chamou a atenção para o fato de que restam ainda grandes obstáculos a serem superados para reduzir a distância entre os países ricos e os pobres, e que as discussões em torno de quem vai pagar a conta continuam emperrando os debates. Outro impasse são as metas obrigatórias.

A primeira semana da reunião em Le Bourget vai chegando ao fim sem que os temas mais espinhosos do documento tenham sido sanados.

Razões para apostar em um final feliz:

É a primeira vez que parece haver um consenso entre chefes de estado e de governo de que é preciso conter as mudanças climáticas. Um sinal claro de que não é mais uma opção política ou moral ignorar as evidências levantadas pelos cientistas de que a mudança climática precisa ser contida, especialmente depois que o ano de 2015 foi considerado o mais quente da história. A opinião pública também está convencida de que é preciso agir. As organizações do Terceiro Setor no mundo todo uniram esforços em torno da ideia de que o mundo chegou a um impasse e a reunião em Bourget é a última chance de se evitar uma catástrofe ambiental. Até o presidente americano Barack Obama já se declarou “otimista” em relação à obtenção de um acordo climático em Paris.

  1. Economia verde é uma opção rentável
O programa brasileiro de incentivo à energia eólica está entre os 17 bons exemplos mundiais que instituições de pesquisa estão levando para a COP21
Programa brasileiro de eólica é exemplo na COP

É grande a expectativa em torno da ideia de que um acordo que obrigue os países a reduzir suas emissões de gases de efeito estufa venha a se transformar em uma opção economicamente sustentável a longo prazo. Um acordo assinado durante a conferência é um sinal claro de que haverá um comprometimento dos governos, o que será entendido pelo setor privado e financeiro como um sinal claro de que apostar numa economia de baixo carbono é um bom negócio. ONGs como Amigos da Terra, BankTrack, Urgewald e Rainforest Action Network fizeram um apelo para que os bancos transfiram rapidamente os investimentos do setor de carvão para as energias renováveis. Os investimentos cada vez mais crescentes em tecnologias renováveis tende, em médio e longo prazos, a reduzir os custos das energias eólica e solar. A expectativa é de que, dentro de 20 anos, os preços de energia renovável caiam enquanto os de combustíveis fósseis venham a ficar mais caros.

2. Compromissos à vista

Antes mesmo do início da COP21, mais de 180 países já haviam apresentado suas metas para reduzir as emissões de gases de efeito estufa. É a primeira vez, desde que tiveram início as negociações climáticas, que praticamente todas as nações têm metas autoimpostas. Uma mudança significativa em comparação há 20 anos quando apenas 37 países assinaram o Protocolo de Kyoto, que não foi referendado pelos maiores poluidores mundias, a China e os Estados Unidos.

3. A chance de sucesso

É alta a expectativa que ronda a COP21. A chance de sucesso é elevada especialmente se comparada com a reunião de Copenhague, em 2009, que foi considerada um fracasso retumbante. Ao contrário das outras conferências, o texto  à mesa é mais curto, mas também mais objetivo. Sem falar no fato de que algumas pendências já foram acertadas. Os maiores poluidores do mundo – China e Estados Unidos, estão mais alinhados e, ao contrário do que ocorreu nos últimos encontros, mais abertos a negociar. Sem falar no fato de o país anfitrião da conferência ser considerado um negociador experiente, o que pode facilitar decisões potencialmente difíceis relativas a finanças.

4. Juntos e misturados

Chefes de estado reunidos na abertura da COP-21
Chefes de estado reunidos na abertura da COP

O atentado em Paris às vésperas do início da Conferência do Clima, a COP21, pode levar os líderes mundiais a se sentirem obrigados a uma declaração de impacto ao final do encontro. Nenhum país vai querer chegar ao fim desta conferência sendo identificado como aquele que inviabilizou um acordo para conter as mudanças climáticas. A recente declaração do presidente do Banco Mundial (Bird), Jim Yong Kim, é uma aposta clara no sucesso da conferência. Na abertura do encontro ele declarou que “Paris ficará conhecida como a cidade onde os líderes mundiais estiveram juntos no lado certo da história”.

 

Razões para não apostar em um final feliz: 

  1. Duas décadas e poucos avanços

Duas décadas depois de negociações infrutíferas, ronda a COP21 o temor de que, novamente, o encontro não tenha um final feliz. O herdeiro da coroa do Reino Unido, príncipe Charles, cobrou um engajamento mais efetivo dos países. Ativista da luta pela proteção de florestas tropicais, defendeu no primeiro dia da conferência o desmatamento zero: “zerar o desmatamento precisa se tornar a norma, e não a exceção”. O apelo foi aplaudido, o que não significa que as principais disparidades entre os países venham a ser equacionadas. Quem vai pagar a conta é um dos temas mais polêmicos do encontro.

2. Metas insuficientes

Produção de minério na China
Produção de minério de ferro na China

Os planos apresentados até agora pelos maiores emissores do mundo conseguiram tirar o planeta Terra de um rumo perigoso: aquecer 3,1ºC até o final do século. Só que ainda não é suficiente para limitar o aquecimento a 2ºC. Se as metas não forem mais ousadas, estaremos caminhando para um aquecimento de 2,7ºC.

3. Fracasso à mesa

Redução das emissões, financiamento e tecnologia são os três assuntos que dividem opiniões na COP21. Países industrializados como Estados Unidos, Reino Unido e Japão são vistos como aqueles que deveriam ser obrigados a cortar mais do que os países em desenvolvimento. A Índia, em nome dos países pobres, defende a tese de que deve haver diferenciação entre ricos e pobres. É um embate difícil de se chegar a um consenso.

4. Quem vai pagar a conta?

O Fundo Verde do Clima foi aprovado em 2010, na COP16, em Cancun. Desde então, saiu do papel apenas parcialmente. O objetivo é atingir a cifra de US$ 100 bilhões até 2020. Os primeiros recursos só começaram a ser efetivamente depositados no ano passado, quando foi arrecadado US$ 10 bilhões provenientes de 29 países. Não é de hoje que financiar o fim da crise ambiental é um dos entraves das negociações. Na COP21 não está sendo diferente, o que levou o G77 (o grupo de países em desenvolvimento) mais a China, a apresentar um manifesto contra a proposta de ampliação da base de doadores para conter o aquecimento global.

Liana Melo

Formada em Jornalismo pela Escola de Comunicação da UFRJ. Especializada em Economia e Meio Ambiente, trabalhou nos jornais “Folha de S.Paulo”, “O Globo”, “Jornal do Brasil”, “O Dia” e na revista “IstoÉ”. Ganhou o 5º Prêmio Imprensa Embratel com a série de reportagens “Máfia dos fiscais”, publicada pela “IstoÉ”. Tem MBA em Responsabilidade Social e Terceiro Setor pela Faculdade de Economia da UFRJ. Foi editora do “Blog Verde”, sobre notícias ambientais no jornal “O Globo”, e da revista “Amanhã”, no mesmo jornal – uma publicação semanal sobre sustentabilidade. Atualmente é repórter e editora do Projeto #Colabora.

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