O drama nordestino e o alerta global

Nível de água da represa de Sobradinho chega ao seu pior nível desde o apagão de 2001 (Foto: Divulgação/Chesf)

Barragem de Sobradinho bate recorde negativo e chega a 2,3% do volume útil

Por Oscar Valporto | ODS 13ODS 6 • Publicada em 20 de novembro de 2015 - 21:20 • Atualizada em 3 de setembro de 2021 - 13:01

Nível de água da represa de Sobradinho chega ao seu pior nível desde o apagão de 2001 (Foto: Divulgação/Chesf)

O nível da barragem de Sobradinho, o maior reservatório de água do Nordeste, caiu esta semana a 2,3% do volume útil, um recorde negativo em meio a prolongada seca, considerada a pior em 50 anos, em todo o semiárido nordestino. Localizado na parte baiana do Vale do São Francisco, quase na divisa com Pernambuco, Sobradinho está em situação que assusta os moradores das cidades vizinhas ao lago.  O nível de água não para de cair: na última semana de outubro, baixou de 5,46%, que era o recorde negativo, registrado em novembro de 2001, ano do apagão do governo Fernando Henrique.

A interrupção do fornecimento de energia, entretanto, não é a maior ameaça hoje, apesar de Sobradinho ser responsável por 58% da água usada para a geração de energia do Nordeste. De acordo com o ONS (Operador Nacional do Sistema), fontes alternativas – desde as poluentes usinas térmicas até as renováveis como eólica e solar – e a transferência de energia de outras regiões são suficientes para evitar um apagão na área.

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Remanso, Casa Nova, Sento-Sé
Pilão Arcado, Sobradinho
Adeus, Adeus …

Mas Sobradinho também é fonte de água para toda a região.  O município baiano de Remanso já deu início ao racionamento de água. Outros 13 municípios vizinhos ao lago decretaram situação de emergência por conta da seca: Casa Nova, Pilão Arcado, Sento Sé, Bom Jesus da Lapa, Carinhanha, Curaçá, Barra, Juazeiro, Paratinga, Serra do Ramalho, Sítio do Mato, Xique-Xique e a própria cidade de Sobradinho, sede da represa.

Mais de 250 mil moradores da região são afetados pela estiagem, que também prejudica agricultores que usam água da barragem para irrigação da produção de frutas. No distrito de irrigação de Nilo Coelho, entre Bahia e Pernambucano, duas mil empresas usam o sistema para garantir água em sua área plantada. A Companhia Hidrelétrica do São Francisco (Chesf), responsável por Sobradinho, calcula que, sem chuva, a barragem chegue ao volume morto “entre o fim de novembro e o começo de dezembro”. Isso significa que, exatamente no período da Convenção do Clima da ONU, será difícil captar água para o consumo e para a irrigação.

Esse cenário coincide com as previsões feitas pelo relatório divulgado semana passada pelo Banco Mundial sobre o impacto das mudanças climáticas sobre os mais pobres. O relatório Ondas de Choque (Shock Waves) prevê que perdas de safra, desastres naturais e propagação de doenças – desdobramentos das mudanças climáticas – podem levar mais de 120 milhões pessoas para a pobreza extrema até 2030, se não forem tomadas medidas para o desenvolvimento sustentável.

Desse número assustador, mais da metade – 67 milhões, pela conta do Banco Mundial – seria levada à pobreza pelas consequências da seca prolongada e do calor intenso na produção e nos preços dos alimentos. A agricultura é o setor com maior impacto das mudanças climáticas para o aumento da pobreza extrema – bem maior do que os causados pelos desastres naturais e pela propagação de doenças como diarreia e malária.

Nos últimos 10 anos, a rede de proteção social do Brasil vem minimizando as consequências da seca no Nordeste. Mas as estiagens cada vez mais prolongadas nos últimos três anos – que agora fazem aparecer em Sobradinho ruínas das antigas cidades inundadas pelo lago da hidrelétrica – são um sinal de que o alerta do Banco Mundial vale tanto para regiões desérticas da África e da Ásia como para o semiárido nordestino.

Oscar Valporto

Oscar Valporto é carioca e jornalista – carioca de mar e bar, de samba e futebol; jornalista, desde 1981, no Jornal do Brasil, O Globo, O Dia, no Governo do Rio, no Viva Rio, no Comitê Olímpico Brasileiro. Voltou ao Rio, em 2016, após oito anos no Correio* (Salvador, Bahia), onde foi editor executivo e editor-chefe. Contribui com o #Colabora desde sua fundação e, desde 2019, é um dos editores do site onde também pública as crônicas #RioéRua, sobre suas andanças pela cidade

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Um comentário em “O drama nordestino e o alerta global

  1. Oscar Valporto disse:

    Nesta quarta, 25/11, a Chesf informou que a barragem de Sobradinho tem a acumulação de água de apenas 1,7% de sua capacidade. A Chesf ainda espera que a temporada de chuvas chegue antes do volume morto. Veremos.

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