Do beija-flor ao uso da caneca

Geija Rocha brinda, com a caneca de plástico, o início da implantação da agenda ambiental na Assembléia Legislativa do Rio

Alerj aposenta copos de plástico e sonha com eficiência energética e gestão de resíduos

Por Angelina Nunes | ODS 12ODS 6 • Publicada em 8 de novembro de 2015 - 10:55 • Atualizada em 8 de novembro de 2015 - 14:50

Geija Rocha brinda, com a caneca de plástico, o início da implantação da agenda ambiental na Assembléia Legislativa do Rio
Geija Rocha brinda, com a caneca de plástico, o início da implantação da agenda ambiental na Assembléia Legislativa do Rio
Geiza Rocha brinda, com a caneca de plástico, o início da implantação da agenda ambiental na Assembléia Legislativa do Rio

Uma caneca de plástico pode provocar mudanças significativas na rotina de trabalho de uma repartição pública. O que isso tem a ver com sustentabilidade? Tudo. Essa mudança aconteceu no Departamento de Informática da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), na Praça Quinze, que substituiu no final do primeiro semestre deste ano os copos descartáveis no setor por 40 canecas e registrou uma queda no consumo mensal de 900 copos para 100 unidades. A meta é zerar. Essa medida se antecipou a projetos aprovados para adoção de medidas sustentáveis que ainda estão em andamento: um plano de gestão de resíduos sólidos, ingresso num programa de eficiência energética e economia de tinta e papel nas impressões. Mas um passeio pelos gabinetes da Casa mostra que uma mudança de hábito requer um trabalho de convencimento diário para que o legislativo fluminense incorpore essa consciência ambiental. Ainda fazem parte da decoração das salas dezenas de copos descartáveis ao lado dos bebedouros. O próximo destino é a lixeira, para depois seguir mais uma jornada de poluição no meio ambiente.  Mudar esse cenário requer um trabalho de formiguinha com atividades internas de conscientização.

A Alerj é uma das 46 instituições públicas do estado que aderiram à Agenda Ambiental na Administração Pública (A3P), programa do Ministério do Meio Ambiente (MMA) que tem o objetivo de promover a responsabilidade socioambiental nas práticas de órgãos públicos. O programa prevê cinco eixos: a coleta seletiva, educação ambiental, licitações sustentáveis, uso racional dos recursos e melhoria no ambiente de trabalho. Geiza Rocha, secretária-geral do Forum Permanente de Desenvolvimento Estratégico do Rio de Janeiro Jornalista Roberto Marinho e coordenadora da implantação da A3P na Alerj, reconhece que é preciso uma mobilização permanente e entender que, em alguns casos, o melhor caminho é deixar que os setores encontrem uma solução que agrade internamente e seja mais facilmente implantada. Um exemplo: no caso dos copos descartáveis o objetivo é entender que a mudança vai contribuir para reduzir o impacto desse lixo no meio ambiente. Alguns setores não adotaram a caneca de plástico, mas começaram a usar copos de vidro, outros preferem o squeeze. Até dezembro será elaborado um relatório para o ministério para avaliar o resultado dessa medida.

As ações são simples, mas alinhadas com a questão ambiental

Um dos primeiros passos para a implantação da A3P foi tentar entender o que os funcionários percebiam como prioridade de ações sustentáveis no seu trabalho. Uma pesquisa com 539 entrevistados, realizada entre junho e setembro deste ano, revelou que 56,8% já faziam a separação do lixo em casa tendo ou não coleta seletiva. Como resultado, a diretoria geral da Alerj comprou uma lixeira de pilhas e baterias e identificou uma associação que fizesse o recolhimento desse material para reciclagem. Tudo de forma gratuita. O próximo passo será a capacitação dos funcionários para praticar, no trabalho, o descarte seletivo de lixo que já fazem em casa. Outro resultado da pesquisa colocou uma pá de cal na instalação de um grande bicicletário: apenas 0,6% já adotam o hábito de ir ao trabalho de bicicleta. Outros 16,5% responderam que poderiam vir com esse veículo, mas a grande maioria não se interessa. Um dos principais motivos é a longa distância que separa as residências dos funcionários do trabalho.

Reduzir o uso de papel

“Ser sustentável é um exercício diário”. Esse é o mantra de Geiza Rocha que faz o trabalho interno de conscientização na Alerj desde 2008 e já fez parte de várias comissões. E faz sentido ela repetir o mantra quando 75,9% dos entrevistados admitem desligar o computador apenas quando vão embora do serviço. Ou seja, mesmo quando está ocioso por horas seguidas, o instrumento de trabalho continua consumindo energia e o funcionário não percebe que poderia fazer a sua parte na agenda ambiental com um simples toque no botão de desligar.  No quesito computador, uma outra medida foi tomada para economizar tinta na impressão: foi instalada a fonte “Ecofont Vera Sans” em 600 dos mil computadores na Casa.  Esta fonte reduz até 50% de tinta ou toner durante a impressão dos documentos.

Mas se trocar a fonte foi um processo suave, o mesmo não se pode dizer do reaproveitamento do verso do papel na hora da impressão. Simples: o uso de folhas de papéis será reduzido se o material for impresso dos dois lados da página.  O resultado da pesquisa já apontava que 83,2% utilizariam a impressão frente e verso assim que ela fosse adotada. No entanto, 11,9% alegavam que não fariam isso porque era proibido.  ”

É um mito achar que documento não pode ser impresso dessa forma. Até o Tribunal de Justiça já faz assim, explica Geiza Rocha. Um velho hábito que leva algum tempo para ser modificado. E que é o destino das cópias impressas apenas de um lado? Viram blocos de notas depois do seu uso.

O papel do legislativo estadual na sustentabilidade foi discutido durante a Rio+20, em 2012, num seminário do Fórum Permanente de Desenvolvimento Estratégico do Rio de Janeiro.  Entre as medidas adotadas, uma das mais populares é a doação de itens que não são mais utilizados. Na última doação, em agosto passado, a ONG Rio Solidário recebeu 1912 itens, como mesas, cadeiras, computadores e 22 sucatas de veículos. O destino do material é a venda para reciclagem. A verba arrecadada é revertida para projetos da instituição.

Mas onde entra nessa história o beija-flor lá do título? Nós jornalistas, que entrevistamos muito o sociólogo Herbert José de Souza, o Betinho, que morreu em 1997, nos acostumamos a ouvir a fábula do beija-flor que tentava apagar um incêndio na floresta, carregando água com seu fino bico. Nas idas e vindas, ele foi criticado pelo leão que argumentava que, sozinho, ele não resolveria o problema. O beija-flor respondia que ele estava fazendo a sua parte. Uma caneca é uma pequena parte, mas que ajuda a resolver um grande problema.

 

Angelina Nunes

Angelina Nunes é mestre em Comunicação pela Uerj (RJ). Ela recebeu prêmios internacionais de jornalismo, como Rey de España, IPYS e SIP, e nacionais, como Esso, Embratel, Vladimir Herzog e CNH. É membro do International Consortium of Investigative Journalists (ICIJ) e coordenadora do Programa Tim Lopes.

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